quarta-feira, abril 28, 2010

Os bons terão sempre lugar no jornalismo, defende Daniel Medina





Antigo director da Televisão de Cabo Verde, Daniel Medina é Professor Doutor da Universidade Lusófona de Cabo Verde (ULCV), no curso de Ciências da Comunicação. Jornalista, cronista de rádio e jornal, comentador da televisão, Medina é um comunicador nato. Nha Terra Online foi conhecer o autor de Pela Geografia do Prazer que se prepara para lançar novo livro no mercado e saber a sua opinião sobre o jornalismo caboverdiano, a sua vida de docente, entre outras questões.

Fotos: Odair Varela

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Como é o seu dia-a-dia como jornalista?

Neste momento não sou jornalista a tempo inteiro, mas sim em part time, mas quando era jornalista oem Portugal, meu dia-a-dia era fulgurante. As seis da manhã já estava a ouvir rádio, particularmente a TSF que passa notícias vinte e quatro horas, por dia. As sete horas tinha que estar com vários jornais a frente enquanto tomava o pequeno-almoço, a ler e a ver quais eram as principais notícias do dia e já tinha passado os olhos pela televisão para saber a temperatura do dia. Depois é que o dia começava mesmo, com reunião da redacção e depois era o que Deus quiser.


O que o jornalismo cabo-verdiano tem de bom e de menos bom?

O jornalismo caboverdiano ainda está a nascer, a ganhar experiência, a ganhar em termos democráticos, estatuto e alguma sapiência. Não penso que tenha algo de mau, tem muito ainda para dar. O que pode ser considerado menos positivo é alguma partidarização de uns colegas, que ao fazerem determinadas intervenções, deixam transparecer claramente a sua linha partidária. Por outro lado, alguma dependência que os órgãos, particularmente os privados, têm em relação ao domínio económico.


Segundo o Artigo 5º do Estatuto do Jornalista, só pode ser jornalista, quem possui um diploma. Essa uma condição sine qua non para se ser um bom jornalista?

Não, porque nas nossas experiências, temos encontrado pessoas que não têm formação na área do jornalismo mas que no entanto tem dado uma contribuição extraordinária.


O anterior presidente da Associação dos Jornalistas de Cabo Verde [Paulo Lima] é da opinião de que o mercado da Comunicação Social irá saturar com a nova vaga de jornalistas que se estão a formar. Qual a sua percepção?

Tenho duas percepções: a primeira é que para os bons haverá sempre lugar. E como Cabo Verde é um País em desenvolvimento, vamos precisar em várias áreas de comunicação, de pessoas competentes. Ainda o mercado não está saturado, possivelmente daqui a uns quatro ou cinco anos o mercado poderá ficar saturado, mas ainda ele não está.


Há produto suficiente (notícias, demanda por publicidade, necessidade de assessoria de imagem, etc.) que justifique a criação de empresa própria na área de Comunicação?

Há espaço ainda para muitas empresas de comunicação, seja de imagem, design ou publicidade que estão ainda virgem ou quase virgem. Como costumo dizer faltam pessoas audazes e que acreditam na sua capacidade, que comecem do zero a fazer coisas com garra mas querendo ser bons, não é mais ou menos desenrascar. Quando a pessoa começar, começa a pensar “eu vou ser bom, neste momento ainda não sou bom mas quero ser bom”, ai há espaço para muita gente.


Qual a importância do domínio de novos idiomas na área de Comunicação?

É fundamental, o jornalista que não domine a língua portuguesa, a inglesa ou outra está frito, cada vez mais há línguas que tornam-se mais internacionais. Por exemplo, o mandarim [chinês oficial] começa a invadir o mundo. Temos que aprender com os chineses que aprendem a nossa língua para conseguir vender-nos algo. Dominar uma língua é dominar a mente e o mercado.

Actualmente é professor na Universidade Lusófona de Cabo Verde no curso de Ciências de Comunicação. Que características positivas a realçar dos estudantes? E que áreas acha que deveriam trabalhar mais?

Características positivas: acho que alguns alunos estão muito curiosos, muito combativos e interactivos. Menos positivos: de vez em quando encontramos alguns um bocado preguiçosos e que não dão combate ao professor, não fazem perguntas pertinente e estão sentados na cadeira a ouvir e a deixar o tempo passar. No compto geral o saldo é positivo, porque acho que os alunos são muito combativos e muito participativos.

Falta é aquilo que digo constantemente, que todos nós devemos fazer – e digo todos nós porque eu também sou vosso colega, só que sou menos novo ou mais velho – devíamos ler todos os dias, fazer perguntas e trocar experiências, porque é isso que faz um bom jornalista: leitura e perspicácia.


Aquilo que ensina-se nas Universidades é suficiente para formação de um bom profissional?

Nunca e nem pensar. O que se ensina em qualquer universidade do mundo só ajuda a que se fique licenciado ou autorizado a trabalhar. Quer dizer que um jornalista, em particular, vai-se formando ao longo da sua vida. Nunca um jornalista está completamente formado.


Existe a percepção de que alguns alunos escolheram a vertente Multimédia por questões financeiras. O jornalista realmente ganha menos que o profissional de Multimédia?

Em princípio sim, porque multimédia é uma área que tem muita procura, por isso as pessoas conseguem pôr o preço lá em cima. Estou-me a lembrar dos primeiros informáticos, em particular, aqueles que criavam as bases de dados, tinham uma vantagem, punham o preço que quisessem. Se dissessem que era duzentos contos, era isso porque não havia alternativas para ir procurar outro, é isso o que se passa na multimédia. Como ainda há pouca gente a trabalhar na área, as pessoas podem ganhar mais e podem colocar o preço que quiserem, mas isso só durante algum tempo.


Que recomendações aos jovens formandos em Comunicação Social?

Que acreditem que são capazes de serem cada dia muito melhores. Quero dizer, cada dia temos a oportunidade de ser muito melhores do que éramos ontem. Cada dia temos a oportunidade de aprender, nem que seja uma palavra ou uma ideia nova. Se isso acontecer, todos os dias tornaremos excelentes jornalistas e estaremos a cumprir com o nosso trabalho, que é informar e bem as pessoas.


O seu livro Geografia do Prazer foi apresentado em maio do ano anterior na ULCV. Fala-nos um pouco desta veia poética.

Não sei se tenho veia poética, acho que o meu livro de “sonho”, de poesia, vai ser o próximo, que se chama Tambor e vai sair dia 5 de março.

Falando de Pela Geografia do Prazer, para mim a vida é um eterno prazer, e aí falo muitas vezes de Freud. O livro é um bocado enigmático, falo de Freud porque desde o momento que começamos a sentir o mamilo da nossa mãe na boca, começamos a apaixonar-nos pela boca.

Se você analisar uma criança a mamar, vê como ela olha para a mãe e para o filho, começam a ficar apaixonados por causa daquela ligação, é o primeiro prazer. Depois há o prazer pelo cheiro, ao comer, aprender coisas todos os dias é um prazer, vivemos num mundo de imenso prazer e não nos damos conta disto.

E são as minhas vivências de solidão, devaneios, loucuras e experimentações que me fizeram escrever Pela Geografia o Prazer. Porque pela geografia, você tem várias coisas: é eu gostar de conhecer todas as ilhas de Cabo Verde é geografia, é eu gostar de conhecer milimetricamente o corpo de uma mulher é geografia. Porque nós somos seres sensoriais, são prazeres que vamos experimentando ao longo da vida.


Fonte: www.nhaterra.com.cv

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